segunda-feira, outubro 30

Direito à vida com dignidade

Durante as minhas férias, um amigo meu emprestou-me um livro muito interessante, que se intitula Freakonomics. Trata-se de um livro de um escritor que pertence a uma nova geração de economias que pretende descomplicar os conceitos associados à Economia utilizando exemplos concretos e fáceis de perceber pelo leitor. Entre outras coisas aborda a temática de como algumas decisões políticas aparentemente marginais se reflectem enormemente no dia a dia das pessoas.
Passo a explicar. Um dos episódios retratados no livro fala sobre clima de insegurança crescente que se vivia nas ruas, nos anos 90, nos Estados Unidos da América. Por essa altura, os índices de criminalidade cresciam todos os anos a dois dígitos, e todas as medidas de combate ao crime postas em prática na altura pareciam não surtir o desejado efeito. Num determinado momento, quando já não havia esperança de que alguma coisa de alterasse o rumo dos acontecimentos, a curva ascendente de criminalidade estabilizou e começou a cair em flecha até aos dias de hoje, em que os níveis são perfeitamente aceitáveis.
Na altura, diversas teorias avançaram para tentar explicar o fenómeno mas nenhuma foi demasiado consistente com excepção de uma, que ninguém estaria perto de imaginar. Alguém se lembrou de olhar vários anos para trás e perceber se encontrava alguma variável que pudesse explicar o fenómeno, chegando a uma conclusão genial: a principal causa da descida da criminalidade devia-se a uma medida tomada 20 anos antes, que tinha sido a liberalização do aborto.
Encontrada a causa, ficava muito fácil de explicar o fenómeno. De uma forma resumida, ninguém nasce com propensão para o crime, mas o meio envolvente em que as crianças de desenvolvem e os modelos que as rodeiam acabam por influenciar determinantemente o seu comportamento futuro. Assim sendo, e tendo em conta a existência do fenómeno do aborto ilegal, que era oneroso e só algumas mulheres podiam suportar, a maioria das crianças indesejadas nasciam em meios pobres e num contexto de mais violência. Ressalvando-se o facto de que mesmo uma criança pobre e indesejada, rodeada de maus modelos por vezes ser originar um adulto perfeitamente integrado e bem comportado (tal como uma criança rica pode tornar-se um adulto criminoso e violento), o que acontece é que estatisticamente uma criança que nasça num meio pobre sem ser desejada é mais propensa a praticar crimes que uma criança rica e desejada.
Tendo isto em mente, e tendo sido legalizado o aborto nos EUA, diminuiu drasticamente a quantidade de crianças com propensão à prática de crimes em adultas.
Transportando-nos agora para a realidade portuguesa, e estando na véspera de mais um referendo ao aborto, venho expressar o meu voto na liberalização do aborto, como forma de melhorar as condições sociais de todos nós.De facto, aquilo a que muitos partidos chamam de decisões sociais, como rendimentos mínimos garantidos, substituição de barracas por casas, acompanhamento social de crianças em risco, podem muito bem ser vistos como verdadeiras medidas económicas que no futuro terão como resultado uma sociedade com melhor qualidade de vida para todas as pessoas.

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